É nas madrugadas que sentimos a falta de tudo que não temos.
Nas madrugadas regadas a uísque e um cigarro querendo apagar que percebemos a nossa
necessidade de ser menos. Isso mesmo ser menos. Menos dramáticos, menos
sentimentais, menos controversos, menos, menos. A simplicidade é algo que nos
assusta, preocupa-nos, nos faz sentir medo. Medo de tudo que parece fácil, tudo
que nos completa, tudo que nos transforma. Talvez o amor seja simples, e por
ser simples difícil de entender.
A complexidade do simples é paradoxal, é doentia a busca
pelo complexo. Algo que nos tira o sono, que nos faz suar. O medo do simples
nada mais é que um flagelo que impossibilita o ser, ser. “No fundo é fácil ser
feliz, difícil é ser simples”. Na trilha sonora da vida buscamos os acordes
mais complexos, e no tilintar da madrugada, nos deixamos levar pelas notas
rebuscadas do silencio. Dói o amor, dói a dor de ser o que é.
Redigimos o poema chamado vida com tinta rubra de sangue. Amamos
buscando o sofrimento, sofremos buscando o amor, e é essa busca que transforma nossa
pacata existência, simples e sutil, num turbilhão de momentos quentes e
intensos, frios e melancólicos, normais e excepcionais. Vivemos a viver, e
deixamos a vida passar como o vento que sopra na brisa do mar, enquanto
procuramos o inalcançável e esticamos nosso braço aonde a mão não alcança. Quem
sabe amar é isso, buscar no outro a simplicidade que não encontramos em nós
mesmos, ou o “eu no outro”. Necessitamos que aqueles que amamos sejam tudo aquilo que não conseguimos
ser, e na implacável viagem da vida, o amor serve de consolo para falta que o
próprio eu nos faz, sendo a figura do talvez predominante na nossa essência.
Talvez escrever bobagens nas madrugadas me acalme. Talvez o sentido do ser é não ter sentido, a resposta esteja na
pergunta, e ela não deva ser feita. Talvez eu deveria ser mais simples, ser
menos o outro, mais eu, e assim a simplicidade me faria mais feliz. Mas talvez eu
não queira essa felicidade, e a complexidade me complete. Talvez na insana passagem
da vida o inalcançável me excite, o fim me faça esquecer os meios e minha viagem não tenha fim, ou tenha e eu não perceba ele chegar, pois estou
muito preocupado procurando-o. Quem sabe o menos não me preencha, o mais me
transborde, o mais ou menos me enoje e o ilimitável me represente...